domingo, 24 de maio de 2009

INÍCIO DOS ANOS 50 : AS PRIMEIRAS CAMIONETAS DE TRANSPORTE COLECTIVO CHEGAM À COMENDA (VAGAS RECORDAÇÕES)




Foi na primeira metade da década de 50 (do século passado) que surgiram na Comenda as primeiras camionetas ditas da carreira. Talvez por volta de 1953. O acontecimento teve grande impacto cá na terra, constituindo, nos primeiros tempos, motivo de grande curiosidade para os nossos conterrâneos. Sobretudo para a petizada da escola, que festejava ruidosamente a chegada do pachorrento veículo à nossa aldeia no final de cada dia.

A empresa de camionagem que assegurava a carreira de passageiros entre Belver e Portalegre, com passagem obrigatória pelo Castelo, era propriedade de Luís T. Martins Murta e estava sediada na capital de distrito. Os autocarros estavam pintados com as cores tradicionais da firma –vermelho e preto- e ostentavam nos seus flancos o nome Murta em caracteres de grande dimensão. Vocacionados, igualmente, para o transporte de volumes de grande porte, esses veículos dispunham de vastas bagageiras nos respectivos tejadilhos, aos quais se acedia graças a uma escadinha montada à retaguarda.

A propósito desses detalhes, o escrevinhador destas linhas (que na altura andaria pelos 7 ou 8 anos de idade) lembra-se de ter ouvido o seguinte diálogo travado entre dois cachopos do seu tempo :

- Ó Zé, o que é que quer dizer a palavra Murta ?

Resposta ingénua (mas inventiva) do interpelado :

- Quer dizer que se agarrares à escada e fores apanhado és ‘murtédo’ !

Isto, porque era hábito de alguns miúdos da minha idade irem esperar a carreira à subida da Ribeira da Venda (onde o motor do veículo perdia fôlego e obrigava a um abrandamento da marcha), para se empoleirarem nas tais escadinhas. Perante, como é óbvio, a natural irritação do motorista e do revisor do autocarro.

Outros cachopos aguardavam, com visível ansiedade, a chegada do autocarro no início da rua grande, perto da sede da antiga Casa do Povo, e acompanhavam-no, correndo atrás dele, gritando :

- Carreira, carreira !!!

É evidente que toda esta euforia era provocada pela novidade e que estas manifestações de regozijo pueril se esbateram com o passar do tempo. Acabando por desaparecer completamente. O que prevaleceu foi o hábito de estar presente na paragem –situada no sítio onde ainda hoje se encontra- para assistir ao embarque e desembarque dos passageiros. Hábito antigo, e também tradicional noutras localidades. Tal como o ilustram e confirmam as imagens cinematográficas da chegada da diligência às cidadezinhas do Faroeste do século XIX.

Curiosidade : A empresa de camionagem Murta (que presumimos já não existir) foi uma das primeiras firmas do ramo a operar no nosso concelho. Com efeito, antes de aparecerem na Comenda, já há muito (desde 1935) que os carros da Murta percorriam o trajecto Portalegre-Estremoz com passagem obrigatória pelo Gavião. Outra linha (entre várias) explorada por esta conhecida companhia de transportes foi (a partir de 1936) a de Alpalhão-Abrantes, também ela com passagem programada pela sede do nosso concelho.

Penso, sem contudo ter a certeza, que esta firma portalegrense foi (em data indeterminada) comprada pela sua congénere João Cândido Belo, de Setúbal; empresa que seria, por sua vez e logo após o 25 de Abril de 1974, integrada na Rodoviária Nacional, companhia formada com os efectivos de uma multitude de empresas estatizadas.



Manuel Monteiro da Silva

4 comentários:

  1. Só falta mesmo uma foto da velhinha "206", que era a "carreira" que nos levava para o Liceu de Portalegre, pessoalmente levou-me durante 6 ou 7 anos, e quando se juntava no Crato com a "134" que vinha da Cunheira, e a "239" de Alter, as 3 juntas na viagem do Crato até Portalegre, era uma nuvem de fumo preto que quem viesse atrás não conseguia ver a estrada...

    Lúcio Rente

    ResponderExcluir
  2. " A empresa de camionagem que assegurava a carreira de passageiros entre Belver e Portalegre, com passagem obrigatória pelo castelo " eu concordo.
    Quero afirmar que o condutor da dita carreira, o prazer, teve muito prazer de voltar a essa terra, nesta década que está terminando.
    Partiu, partiu a isso obrigado foi, sua esposa não se conseguiu adaptar. A sua morada, o lugar onde esteve a viver foi na 5 de Outubro.
    Quero finalizar, uma história resumida, pois não a estou lembrando muito, a dita, penso que o acontecimento ocorreu no final, no final da metade da metade dos anos 70, um jovem de fora, roubar as duas, não foi muito longe, uma ficou no estacal, a outra ao pé de uma serralharia na rua do Monte da Pedra.

    ResponderExcluir
  3. Mas que está tudo bem, mesmo assim, eu ainda recordo, os meus arquivos já foram e era uma vez, mesmo assim. eu ainda me recordo, nos anos 60, eu li no amigo jornal " COMENDA ", não posso precisar o ano e o número, mas li, por tudo o que seja mais verdade nesta vida, que a camioneta que vinha de Portalegre, no Monte da Pedre ficava e alguém do vosso povo pedia, pedia e agredecia, que na Comenda ela chegasse...

    ResponderExcluir
  4. Bonita narrativa. Só falta mesmo a foto da camioneta da empresa "Murta". por acaso alguem tem alguma que a possa publicar neste blog?

    ResponderExcluir