terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

O CAPOTE ALENTEJANO




Foi com algum alarido (e exagero no propósito) que, nestes últimos tempos, a imprensa nacional se referiu ao outrora tradicional capote alentejano. A dar crédito ao que se leu em revistas e jornais e àquilo que se viu e ouviu numa pequena reportagem da televisão sobre o assunto, ficaríamos (se não tivéssemos miolos) com a impressão de que esse agasalho transtagano está a fazer furor nalgumas capitais mundiais da moda, como Paris ou Nova Iorque. E isto, porque o proprietário da pequena fábrica de Santa Eulália (aqui no nosso distrito) que os confecciona, disse ter alguns clientes nessas metrópoles da estranja. Que, lembramos, têm, cada uma delas, mais de 10 milhões de habitantes e onde, mesmo exportando a totalidade da sua produção anual de 700 unidades, a tal fábrica não conseguiria obter a visibilidade para os seus capotes que os jornais exageradamente pretenderam. Enfim, especulações de jornalistas e exageros à boa maneira portuguesa…
A verdade é que esse longo manto de fazenda de lã (que já foi, noutros tempos, em grosseiro burel), com a sua característica gola em pele de raposa, já há muito que foi -mesmo no Alentejo substituído por sobretudos e outros agasalhos de corte mais moderno, menos complicado. Já lá vai, pois o tempo, em que ele (o capote alentejano) era assim como que o distintivo dos agricultores abastados da nossa região e, numa versão mais rústica e de inferior qualidade, o mata-frio dos pastores da ‘Charneca Heróica’.
Hoje, ainda se vê por aí (felizmente!) vestindo, da cabeça aos pés, alguns nostálgicos e outras pessoas que o experimentaram e se sentiram (e sentem) bem no interior de uma peça vestimentar que é, indubitavelmente, das mais confortáveis. A mulher do escrevinhador de serviço tem um há mais de 10 anos e, segundo o seu testemunho, o capote alentejano é o ideal para afrontar Invernos como este que actualmente nos flagela, particularmente frio e chuvoso.
Num passado relativamente recente, o nosso capote foi usado por pessoas de alta posição social como, por exemplo, os últimos reis da dinastia de Bragança; e hoje é envergado por figuras públicas como D. Duarte Pio e os antigos presidentes da República Jorge Sampaio e Mário Soares, entre outras. É também curioso lembrar que José Saramago, galardoado com o Prémio Nobel de Literatura, teve o bom gosto de se apresentar ao rei da Suécia nesse traje, no dia em que recebeu tão alta distinção internacional. Outro detalhe que abona a favor do velho e nobre capote, foi o facto de ele ter sido escolhido para vestir os soldados portugueses da Grande Guerra, que, entre 1917 e 1918, tiveram de afrontar (além do inimigo tudesco) os rigores do clima da Flandres. Assim, o capote alentejano, que sempre teve os seus incondicionais, voltou a ganhar os favores de alguns cidadãos desta terra, que, usando-o, vão mantendo viva uma tradição secular. E, ao mesmo tempo, dando trabalho às costureiras do senhor José Alpedrinha, proprietário da tal fábrica de Santa Eulália (única em Portugal), que os confecciona segundo as melhores regras da arte da alfaiataria. Os capotes alentejanos ainda podem ser adornados com peles de raposa, mas vemo-los agora, mais amiúde, com golas de pele de borrego ou de fazenda. É uma questão de gosto pessoal e de preço. Refira-se a esse propósito, que o valor de um destes agasalhos pode oscilar, nas lojas e nos dias de hoje (segundo apurámos), entre 180 e 300 Euros.

Manuel Monteiro silva

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