quarta-feira, 10 de junho de 2009

TERÁ A GUERRA CIVIL DE ESPANHA (1936-1939) COMEÇADO NA COMENDA ?


Campo de aviação de Comenda






O título é, naturalmente, provocador e algo exagerado. Mas, em boa verdade, não é assim tão fantasioso como, à primeira impressão, pode parecer. Senão vejamos :

Parte consistente do território da nossa freguesia foi propriedade do Dr. José Adriano Pequito Rebelo (1893-1983), advogado, escritor, político, lavrador e aviador nascido em Gavião. Este poderoso latifundiário local, que muita gente da nossa terra ainda chegou a conhecer, foi um dos fundadores do Integralismo Lusitano, um movimento que, em Portugal, defendeu o regresso a uma «monarquia orgânica tradicionalista, anti-parlamentar», na qual o rei disporia de um poder quasi absoluto.

Com o fracasso da revolta monárquica de Monsanto, ocorrida em 1919, durante a qual Pequito Rebelo ficou gravemente ferido e foi depois julgado em conselho de guerra (e absolvido), o movimento integralista esmoreceu. Inicialmente zangado com as autoridades do chamado Estado Novo, Pequito Rebelo acabaria por se reconciliar com o regime ditatorial aquando da eclosão das guerras de África (1961). Guerras nas quais ele próprio participou, executando –em Angola- missões aéreas (com o seu avião pessoal) de apoio à acção das tropas portuguesas.

Mas voltemos a meados dos anos 30 e à Guerra Civil de Espanha (que teve lugar mesmo aqui ao lado), o acontecimento mais trágico, ocorrido na península Ibérica em todo o século XX. Sem pretender alongar-me sobre os complexos (e ainda hoje controversos) acontecimentos que levaram à eclosão do conflito, convém, no entanto, dizer que o país vizinho vivia em 1936 sob um regime republicano, que se impusera nas urnas, democraticamente. Nesse fatídico ano, um grupo de oficiais generais identificados com a Direita política decidiu rebelar-se contra o governo de Madrid, socorrendo-se das tropas que se encontravam às suas ordens. Um desses oficiais de alta patente –Francisco Franco- auto proclamou-se Chefe das Forças Armadas de África (uma parte do território marroquino encontrava-se então sob administração espanhola), sublevou as guarnições -constituídas, no essencial, por mouros e legionários- e declarou-se abertamente contra o poder legal.

Mas esse tal efectivo militar, que viria a tornar-se decisivo durante o conflito que se avizinhava, não podia atravessar o Mediterrâneo e colocar pé em Espanha devido à vigilância apertada da marinha de guerra, que optara, na sua maioria, por permanecer fiel à República. Foi nesse contexto, que Hitler decidiu disponibilizar um certo número de aviões da ‘Luftwaffe’, para assegurar uma ponte aérea intercontinental. Esses aparelhos (uma vintena, ao que parece) eram trimotores de transporte Junkers Ju-52/3m, que, na sua longa viagem da Alemanha para Marrocos, fizeram uma escala técnica (para reabastecimento) no campo de aviação do Dr. Rebelo, cuja pista ainda hoje existe nas proximidades da nossa aldeia. Parece-nos óbvio que essa operação só poderia ser levada a cabo depois de cuidadosamente pensada e minuciosamente preparada pelas partes interessadas : governo português, autoridades nazis (talvez representadas pela embaixada da Alemanha em Lisboa), representantes dos nacionalistas espanhóis e o próprio latifundiário alentejano. Latifundiário que, pouco depois do início da sangrenta Guerra Civil de Espanha, ofereceria os seus préstimos de piloto-aviador a Franco; que os aceitou e os recompensaria.

Estas manobras secretas que se desenrolaram aqui tão perto de nós, estão sucintamente consignadas num livro intitulado «1936-1939 : Salazar, rectaguarda de Franco». O livro em causa faz parte (com o nº 4) de uma colecção chamada ‘Os anos de Salazar’, actualmente à venda nas bancas dos jornais. Do texto de apresentação do volume (na contracapa) permitimo-nos transcrever as seguintes palavras : «...os aviões Junkers 52 fazem o trajecto da Alemanha a Marrocos reabastecendo na Herdade da Comenda (sic), perto do Gavião, no Alto Alentejo, propriedade do Engº (resic) Pequito Rebelo, um grande latifundiário integralista, amante da aviação».

Corrigimos (como todos os leitores deste blogue já o fizeram), afirmando que a herdade referida era a do Polvorão, sita, isso sim, na freguesia da Comenda e então propriedade do Dr. (e não do engenheiro) Pequito Rebelo.

O autor destas despretensiosas linhas deseja aqui (e apenas) evocar um facto pouco conhecido dos próprios comendenses e que teve, não haja dúvidas, uma importância relevante no desencadeamento de um conflito que, embora sem mortos na nossa terra, também muito afectou a sua população. Lembrem-se os mais antigos dos nossos conterrâneos das mil e uma restrições impostas, nessa época, pelo regime de Oliveira Salazar : bichas para o pão e outros víveres essenciais; rusgas por parte da G.N.R. e por outras forças policiais do tempo para tentarem encontrar refugiados espanhóis; perseguição a todos aqueles que, de perto ou de longe, se desviavam da linha de pensamento traçada pelo ditador de Santa Comba, etc, etc.

Reconhecemos (agora e sem dificuldade) que a mortífera Guerra de Espanha não começou precisamente na Comenda. Mas que teve aqui, na nossa terra, um episódio importante da sua génese, lá isso é que teve.

Para finalizar (e já em margem do que aqui escrevemos), lançamos, uma vez mais, um apelo aos comendenses para que colaborem na feitura deste blogue; enviando textos inéditos (sobre qualquer tema de interesse local) e/ou fazendo comentários (construtivos) aos textos já publicados pelo Danny. Textos que podem ser completados por outras informações de que possam dispor e que serão sempre bem-vindas. Obrigado pela vossa futura colaboração.


Manuel Monteiro da Silva

8 comentários:

  1. Só consigo dizer que é uma honra enorme ter Alguém na "minha Terra" a escrever assim, sobre este assunto não tinha a mínima idéia de que tivesse acontecido, adoro História e as Histórias da "minha terra" ainda mais. Há boa maneira Portuguesa, Bem-haja e continue.
    Lúcio Rente

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  2. O seu avião, a avioneta, o meio aéreo que o Dr. Pequito Rebelo tinha, tinha e era propriedade sua e do seu espaço pessoal, o seu nome, o meio de transporte referdo se chamava " Passarola "

    A " Passarola ", a sua avioneta, o seu avião pessoal, ele era um " Miles DH gipsi Majos de 130 Cv ". Era um monoplano de asa baixa.

    Para terminar, eu gostava de salientar e focar, na dita, O Dr. Pequito Rebelo usava colado e afixado, um mapa, da Península Ibérica.
    O outro lado, no outro lado estava a cruz de Santo André, negra, a referida, ela estava sobre um fundo branco.
    A matrícula " CS-AAL ", era portuguesa e cívil...

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  3. Quero apenas salientar que o ano de 1893 mencionado no texto, na minha opinião não está correcto, os meus dados, eles apontam para o ano de 21 de Maio de 1892...

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  4. Sem haver uma noção de apercebimento, que sem haver um aperceber, o gosto eu também o sei e também o canto, o gosto da vossa terra e aldeia, esta coisa de escrever e pensar e defender o que é vosso, uma coisa de ficar tão colado, achar que é um ser e uma coisa tão grande e tão vida, quando os seus actores e filhos a conseguem sabotar, não deixa de ser sua pena e caneta a unir o que é vosso, que sem querer, um lado fica Eusébio Leão e Francisco Ventura, o outro, na Balança, António Ferro e Pequito Rebelo, que,
    que não deixa de pender sempre para vosso lado.......

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  5. Se algum dia, qualquer pessoa que venha abordar, a vida e obra, da pessoa em questão, do Dr. Pequito Rebelo, não fazendo uma abordagem ao pensamento das vossas gentes, que nas " Sortes ", na " Inspeccão Militar ", ainda nos anos oitenta, ainda insistia e dizia, que " quem não ia para a tropa não era homem " e depois, quando os filhos partiam para o Ultramar começavam a chorar, não deixa de ser um trabalho parcial e muito tendencioso...

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  6. Que eu, no que me toca, sempre prefiro mais o " Integralismo Lusitano ", que uma questão bélica e guerreira, tem mais qualidade para o meu cérebro e ajuda mais a compreeder o meu presente em tantos anos de História!

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  7. Que no que toca ao meu desenvolvimento de ser humano, ao meu crescimento intelectual como cidadão neste País, prefiro mais o " Integralismo Lusitano " do que uma questão bélica e guerreira.
    Não importa se deva ser o rei ou o presidente, o que me importa é compreeder tantos anos de História, dar uma explicação a esta minha existência e o rumo para onde todos possamos caminhar...

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  8. esta história verdadeira sobre a participação de Pequito Rebelo no apoio ao fascista Franco, não abona nada em favor da nossa freguesia, e quero dizer que por via disso,houve sempre um agradecimento publico fomentado pela igreja a pessoa de Pequito Rebelo como benemérito da freguesia de Comenda, recordo que na década de 60 Pequito Rebelo periódicamente sobrevoava a Comenda para assinalar a sua presença e por de sobreaviso os seus apaniguados. com todas as letras Pequito Rebelo era um fascista e simultaneamente falangista.

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